A estratégia brasileira de discrição em São Francisco foi exatamente oposta ao
histrionismo exibido na Liga das Nações, mas tampouco teve êxito. Eis um dilema a
ponderar. Excelentes credenciais e uma campanha bem articulada podem contribuir para
fortalecer o pleito, mas a consecução da meta fixada, por sua natureza
fundamentalmente política, depende também de outros fatores mais amplos e de um
projeto global de política externa que dê sustentação crível à candidatura. Esses
requisitos estiveram ausentes tanto em 1926 quanto em 1945.
Restava ao Brasil a opção de se tornar membro não permanente pelo voto da
Assembleia Geral. Freitas-Valle estimava necessário assegurar que o Brasil fosse eleito
para o Conselho de Segurança e outros órgãos principais da ONU. Sabia que a disputa
seria renhida. “Por causa disto é que antes afirmei que não será tarefa fácil a que
incumbirá a Vossa Excelência [Leão Velloso], de vindicar no concerto das nações para
o Brasil o lugar que, em verdade, lhe compete. Não se esqueça que a Ucrânia, o Egito e
o Canadá também pretendem ser o sexto país (depois dos Big Five) do mundo”.
Assim, quando o Brasil foi eleito pela primeira vez membro temporário para um
mandato de dois anos (1946-47), com votação expressiva, Freitas-Valle avaliou que a
vitória era justa, pois dessa forma o Brasil via satisfeita “sua única e legítima aspiração
no seio das Nações Unidas”, ou seja, integrar o órgão máximo da estrutura recém-criada
pela Carta. Teria sido uma maneira de recompensar o esforço que o Brasil fizera na
guerra, como o único país latino-americano a despachar forças militares para o combate
na Europa.
O saldo da experiência, porém, terá permanecido como uma realização não
plenamente cumprida. Por muito tempo ainda, políticos e diplomatas brasileiros
sopesaram acerca do que “poderia ter sido”, caso fosse outra a configuração de fatores
ao final da guerra para fazer do Brasil o sexto membro permanente.
O fundador de uma tradição
Algumas hipóteses já foram sugeridas para tentar esclarecer o porquê de ser o
Brasil o primeiro país a discursar na abertura do debate geral, no mês de setembro, da
Assembleia Geral da ONU. Tratado como “prática estabelecida” pelo Secretariado, esse
Freitas-Valle a Leão Velloso, ofício, Ottawa, 28 jul. 1945, CFV ad 1944.09.20.
Freitas-Valle a Leão Velloso, ofício, Londres, 17 set. 1945, CDO, Maço 40.235.
Anos depois, João Neves da Fontoura, Chanceler no segundo governo Vargas, talvez refletindo o modo
de ver do próprio Presidente da República, expressou-se a favor daquele objetivo, não sem um sentimento
contido de pesar e frustração: “Sempre considerei que o nosso país merecia ter sido membro permanente
do referido Conselho [de Segurança]. Mas a história se repetiu em 1945 como na falecida Liga das
Nações. E ficamos fora”. Fontoura a Freitas-Valle, carta, Rio de Janeiro, 21 jan. 1953, CFV ad
1944.09.20.